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09/11/2021
É preciso crer e confiar
Reflexões sobre a Fé

Na reflexão anterior sobre a fé, abordei, de forma espiritual e teológica, sua relação com a obediência e a comunhão. Hoje irei falar dessa realidade, fé como um ato de crer e confiar em Deus.
Para o católico, crer em Deus é uma verdade existencial. Mas não podemos compreender o termo “crer” com base em significados que nos apontam os dicionários, correndo o risco de reduzir simplesmente a sinônimos como “acreditar, julgar, supor, dar créditos”. Não podemos substancializar o ato de crer como um mero folclore ou somente creditar, descreditar ou, ainda, desacreditar. O ato de crer vai além daquilo que é humano, pois é preciso lembrar que “também os demônios creem” (Tg 2,19) em Deus, mas já não são mais capazes de obedecer, pois não estão em mera ou plena comunhão.
A Igreja, mestra e perita em humanidade, instrui-nos, a partir de Santo Agostinho, que “crer, nada mais é senão pensar consentindo [...]. Todo o que crê, pensa; crendo pensa, e pensando crê [...]. A fé, se não for pensada, nada é” (De prædestinatione Sanctorum) e que “se se tira o assentimento, tira-se a fé, pois, sem o assentimento, realmente não se crê” (De fide, spe et caritate). Por isso, é necessário crer, mas com a inteligência da fé e no uso da razão, isto é, com a compreensão de que crer já pressupõe atos cristãos de obediência e comunhão em Deus.
A fé tem sinais claros e, de forma especial, por meio de testemunhos de fidelidade, de pessoas que confiam, sem medidas, em Deus, criador do céu e da terra. Judite, personagem bíblica, é umas das mulheres que confiou na supremacia de Deus, como aquele que ouve e pode intervir, com sua misericórdia, na vida do seu povo. É na boca dela que o escritor sagrado coloca um grande sinal de confiança: “Deus do céu, criador das águas e senhor de toda a criação, ouvi uma pobre suplicante que só confia em vossa misericórdia” (Jt 9,17). Cantará também o salmista: “confia ao Senhor a tua sorte, espera nele, e ele agirá” (Sl 36,5); ou ainda a citação do autor de Lamentações ao expressar que “o Senhor é bom para quem nele confia, para a alma que o procura” (Lm 3,25).
O ato de confiar interpela e convida o homem a compreender que a confiança não pode partir dos méritos ou capacidades humanas. Só podemos depositar confiança se primeiramente Alguém (Deus) nos deu a graça de confiar. O poder de confiar é uma “capacidade que vem de Deus” (2Cor 3,4-6), de forma que somos integrantes nesse mistério de amor. Por isso, o salmista diz que “alguns confiam em carros e outros em cavalos (isto é, na força do exército), mas nós confiamos no nome do Senhor, o nosso Deus” (Sl 20,7).
Só consegue confiar aquele que reconhece, entre tantas outras virtudes, a necessidade livre da obediência, que insere o homem na comunhão com a Igreja e o orienta na verdade para crer com inteligência. Como fim último, cabe ao cristão se entregar totalmente à vontade de Deus. Viver profundamente a comunhão com obediência, crendo e confiando na misericórdia de Deus, fruto do amor sublime da Trindade é, sem dúvidas, experenciar a doação, o “Ágape”, o amor de Cristo.
Na próxima e última reflexão sobre a fé, vou abordar sobre a necessidade de estarmos sintonizados com a Verdade em Jesus Cristo e o ato de se entregar livremente à vontade de Deus.
Que Deus o abençoe!
Pe. Vilmar Barreto