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05/07/2017
O Desafio da Indiferença Religiosa
Certamente, estamos diante de um dos grandes e graves problemas que a modernidade respira. Quais são as raízes do afastamento de Deus tão presentes nos dias de hoje? Em sua mensagem para o Dia Mundial da Paz, de 1º de janeiro de 2016, o papa Francisco tocou na temática da globalização da indiferença como um dos obstáculos a serem vencidos na promoção da paz mundial.
Essa indiferença, no tocante à experiência religiosa, em muito tem a ver com a difusão de conceitos tão nefastos à genuína experiência cristã, tais como a “ideia de Deus”, tão desligada de uma experiência única com Deus-Pessoa, encarnado na história, em Jesus de Nazaré, chamado de “universal- concreto”, como apresentado pelo teólogo Claude Geffré, nos tempos conciliares. Sem a concretude histórica de Jesus, o universal que Ele é como Pessoa Divina pode perder-se numa abstração perigosa.
É necessário lançar luzes sobre o tema da indiferença religiosa que, além de ser um fenômeno sociocultural com amplos desafios teológicos, também é um risco que pode estar presente na vida cotidiana da Igreja, em nossas paróquias, na ação evangelizadora e, sobretudo, quando a Igreja se aproxima das realidades urbanas, tão difíceis, tão desafiadoras e portadoras de uma complexidade própria.
O Catecismo da Igreja Católica constitui uma cristalina verdade no tocante à indiferença religiosa: “Pode-se pecar de diversas maneiras contra o amor de Deus: a indiferença negligencia ou recusa a consideração da caridade divina, menospreza a iniciativa (de Deus em nos amar) e nega sua força. A ingratidão omite ou se recusa a reconhecer a caridade divina e a pagar amor com amor” (CIC, n. 2094). Prossegue a Igreja ensinando que a tibieza é uma hesitação ou uma negligência em responder ao amor divino. Aqui o homem corre o risco de recusar-se a se entregar ao dinamismo da caridade. Acrescenta que “a acídia ou preguiça espiritual chega a recusar até a alegria que vem de Deus e a ter horror ao bem divino. O ódio a Deus vem do orgulho. Opõe-se ao amor de Deus, cuja bondade nega, e atreve-se a maldizê-lo como aquele que proíbe os pecados e inflige as penas” (CIC, n. 2094).
Pela indiferença religiosa, a pessoa humana se fecha a Deus. Diretamente, por meio do ateísmo, ou indiretamente, por meio do relativismo religioso e da não aceitação serena das orientações e determinações da vida eclesial para a prática ordinária da fé cristã. Olha-se com desconfiança para tudo o que provém da autoridade eclesiástica em matéria de Fé. Em decorrência disso, logo se vê cristãos participarem de outros movimentos religiosos paralelos à vida da Igreja. Essa recusa à Caridade faz criar na pessoa humana também um certo isolamento individualizante. É preciso a profecia da superação da indiferença e do isolacionismo.
O homem do nosso tempo carece dos grandes elementos explicativos da fé que professa. Uma Fé explicada é o início para uma Fé vivida. Se no passado das primeiras comunidades do cristianismo o testemunho dos seguidores do Crucificado, a escuta da Palavra e a fração do Pão – expressões da beleza da novidade cristã –, associados à simplicidade da vida dos primeiros cristãos, eram, em geral, sufi cientes para converter multidões, nos tempos atuais, o diálogo com a racionalidade, ao menos em solo ocidental, é condição fundamental e desafiadora para que a mensagem cristã invada as mentalidades, preencha a vida de verdadeiro e autêntico sentido.
Portanto, faça-se renascer, no homem contemporâneo, o Deus vivo, adormecido em meio a tantas cinzas que são jogadas sobre a experiência de Fé. E volte-se a viver uma religiosidade genuína, a armazenar dentro de si uma certeza de que os ventos não derrubarão o sólido edifício do grande dom de Deus recebido no Batismo: a Fé.
Dom Washington Cruz, CP
Arcebispo Metropolitano de Goiânia
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